"A felicidade de que gozei, quando nela reflito, induziu-me algumas vezes a dizer que, se me fosse dado escolher, nada teria a objetar à repetição da mesma vida, desde o seu início, almejando apenas a possibilidade de que dispõem os autores de qualquer obra de corrigir na segunda edição os erros que se lhes deparam na primeira."
Benjamin Franklin
Uma página em branco
Viver é sempre como escrever um diário a próprio punho. A letra se transforma enquanto deixamos de ser crianças, as palavras mudam enquanto aprendemos a ser adultos e as frases são ressignificadas enquanto descobrimos um pouco mais sobre nós mesmos. A mudança é a única certeza. Folhear esse antigo caderno, que nos acompanha desde antes de aprendermos a escrever, é enxergar a nossa história como um prólogo a para o que faremos hoje. Se, por ironia do destino, entre um folhear e outro de páginas, pudéssemos reescrever a própria história, e para isso tivéssemos que escolher entre recomeçar a partir desse caderno com rabiscos ou um novo com páginas em branco, não hesitaria em começar tudo novamente.
E não é
por desprezo ou desgosto à vida, pois em nada a mudaria. É que a vida, até
hoje, me fez duvidar que exista uma maneira certa de vivê-la, a qual não mais questionaríamos
de onde viemos e para onde vamos. Nem mesmo, que exista um fim único e perfeito
para ela, que após consecutivas mudanças e melhorias de rumo, estaríamos plenamente
satisfeitos com o que fora escrito. Ou ainda, que exista uma forma ideal de
cultivar a vida, de modo que satisfaça permanentemente a estética do momento. Por
isso, apagar e reescrever o que já foi escrito, mudando tudo aquilo que nos
incomoda, não construirá uma vida melhor, apenas uma nova vida, tal qual
começar um caderno em branco.
Aprender com a experiência é uma das grandes invenções que a cultura nos proporcionou, mas isso não significa que devemos insistir nos nossos velhos rabiscos. O caminho que elimina as dúvidas e as incertezas pode ser uma mera ilusão de um observador incapaz de ver além das próprias limitações. O questionamento, e toda incerteza que isso implica, é o motor que nos permite explorar o que há de novo para ser vivido.
Um caderno em branco dá a liberdade de escrevermos o que e como quisermos. Diferente dos rabiscos, uma página em branco sempre será sempre uma página em branco, independente de onde ela esteja. Por isso, preencher esse caderno é preencher a angústia da liberdade do branco pelas linhas tortas e imperfeitas de quem nós somos e seremos. E apenas quando entendemos o passado como um prólogo para o futuro é que descobrimos o verdadeiro significado de uma nova página em nossa vida.
Fagner Z.
Muito obrigado, Fagner! Texto de profunda reflexão metafísica e de autoconhecimento refinado... Uma imensa contribuição para nossa missão: Pensar e Escrever!!!
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